domingo, maio 26, 2013

As "Três Marias" não se chamam Marias...

O grupo "As Três Marias", sendo entrevistado pela Revista do Rádio, em Outubro de 1948.

Em um dia do ano de 1942, José Mauro, àquela época integrando o quadro de produtores da Rádio Nacional, teve uma ideia singular: criar um conjunto vocal feminino. Chamou Marília Batista, contou-lhe o que planejara, notificou-a de que ela seria uma das integrantes do nóvel conjunto e encarregou-a de arranjar as suas companheiras, que seriam duas. A irmã de Henrique Batista conseguiu imediatamente a adesão de Bidu Reis e Salomé Cotelil. José Mouro, entretanto, custou a arranjar um nome para batizar condignamente o trio.

Consultou livros, virou, mexeu, até que, um dia, cansado de tanto dar tratos à bola, fitou longamente o céu e sentiu um estalo, semelhante ao de Vieira: o conjunto chamar-se-ia “Três Marias”, já que foram as estrelas assim chamadas que lhe inspiraram.

As primeiras "Marias"

As primeiras "Marias" do homogêneo trio, Bidu Reis, Marília Batista e Salomé Cotelli acabaram dispensando-se. Bidu foi para a Globo; Salomé retornou à Tupi e Marília trocou o rádio pelo lar. Nem todas ao mesmo tempo, é óbvio. Salomé Cotelli foi a primeira, sendo substituída por Regina Célia, que é, portanto, a mais antiga das "Três Marias". No lugar de Bidú entrou Consuelo Sierra e no de Marília, Heydnar Martins.

As "Marias" atuais

Atualmente, as “Três Marias” compõem-se de Regina Célia, Heydnar Martins e Bidú Reis, que retornou ao popular trio ocupando o lugar deixado por Consuelo Sierra, a qual deixou o microfone para casar-se.

Excursões, gravações, filmagens, etc.

Há dias, a reportagem da Revista do Rádio esteve na Rádio Tupi, “habitat” atual das “Três Marias”, tendo oportunidade de palestrar longamente com as jovens e alegres integrantes do referido trio. Primeiramente, indagamos se era verdade que pretendiam excursionar, dentro em breve.

— Claro — responderam em uníssono.

E Heydnar, a lourinha do conjunto, explicou ao repórter:

— Tivemos o grato prazer, a pouco, de conhecer o norte brasileiro. Agora, queremos visitar o sul.

— Para isso — acrescenta Regina Célia — estamos estudando diversas propostas que nos chegaram.

— Têm alguma gravação em perspectiva? — perguntamos.

— No momento, não — informou Bidu Reis, que até então se mantivera silenciosa. — Mas não estamos descontentes, pois “América Tropical”, versão de Lourival Faissal; “Vou vender meu barco”, batuque de Alberto Ribeiro, e “Tic-tac do relógio”, samba-swing, de Dunga, melodias essas que foram criadas por nós, estão obtendo algum sucesso.

— É fato que vocês tomaram parte numa película argentina?

— Sim, — nos respondeu Regina Célia. — Figuramos em “Não me diga adeus”, filme argentino, no qual apareceremos ao lado de diversos artistas patrícios. Antes tomamos parte em “E’ proibido sonhar”, produção do cinema brasileiro.

A nova moda feminina

Assunto de todos os momentos, dada sua atualidade, a nova moda feminina não poderia deixar de surgir em nossa palestra. Quando perguntamos a opinião das Marias que não são Marias, sobre o assunto, o ambiente esquentou, leitores. Enquanto Regina Célia afirmou peremptoriamente:

— Não gosto das saias compridas porque nada têm de prático!

Heydnar Martins, convictamente, asseverou:

— Sou francamente favorável à nova moda feminina, pois ela torna a mulher mais elegante!

E começaram a discutir, as duas, acaloradamente, cada uma querendo a vitória do seu ponto de vista. Resolvemos intervir na discussão, dizendo que a opinião de Bidu Reis ainda não fora ouvida, o que poderia modificar radicalmente o curso do debate. A discussão cessou, como por encanto, e Bidu afirmou:

— Não sou contra nem a favor. Ou melhor: gosto de saias compridas no inverno e de saias curtas no verão...

O casamento não acabará com o trio

Como o matrimônio tem acabado com inúmeros conjuntos vocais femininos e quase fez o mesmo com as “Três Marias”, perguntamos se, não seria provável tal coisa acontecer num futuro muito próximo.

—Qual o que!  disse a veterana Regina Célia, — A turma agora está unida. Pode vir casamento que o conjunto continua...

Momentos depois, as joviais “Marias” deixavam o repórter, pois estava na hora do ensaio. Vimos, então, que a assertiva de Regina Célia tinha a sua razão de ser. O trio está entusiasmado. Trabalha de verdade. Quer subir cada vez mais. E os seus admiradores não poupam elos nem envelopes, escrevendo-lhe milhares de cartas, prova cabal de que as “Três Marias” quer ilustrando partituras, em “solos”, ou interpretando “jingles” vão vencendo, criando um prestígio merecido.

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 Fonte: Revista do Rádio - Outubro de 1948.

Como se forma um conjunto

"A mais recente foto do popular conjunto.
Reparem que o Coringa é o do pandeiro."
A história dos Quatros Ases e Um Coringa: os cearenses que abafaram no Rio.

"Em 1936, veio de Fortaleza, um rapaz chamado Evenor, a fim de fazer o curso de Químico Industrial. Logo depois, chegava também André, que nesse tempo tinha o apelido de "Melé". Os dois estudavam e moravam juntos, como fazem tantos outros estudantes. Evenor tocava seu cavaquinho mais ou menos e "Melé" gostava de batucar num pandeiro...

Em 1938, veio se juntar aos dois, Permínio, irmão de Evenor, que cantava regularmente. Assim estava formado um trio de estudantes que alegrava os companheiros nas horas vagas, cantando as músicas populares do momento e as mais lindas melodias do Ceará. Em 1939, com a chegada de José, outro irmão de Evenor, que também tocava e cantava, o conjunto tomou aspecto de coisa séria, passando, então, a participar de festinhas familiares.

Animados por seus colegas, resolveram tentar uma audição em emissora. Assim conseguiram cantar no programa "Alma do Sertão" de Renato Murce, nessa época transmitida pelo Rádio Clube do Brasil. Apesar de muito agradarem, a PRA-3, não estava em condições de poder contratá-los. Sendo assim, resolveram continuar os estudos e... os ensaios, é claro!

Por ocasião da formatura de Evenor, estando os demais em férias, os rapazes resolveram dar um pulo em Fortaleza, a fim de visitar suas famílias. Lá chegando, "Melé" apresentou aos companheiros um ex-violonista do "Bando Liceal". Tratava-se de Esdras, ou melhor, "Pijuca", com alguma prática de conjunto e demonstrando reais qualidades. Imediatamente todos se convenceram que deveriam formar um quinteto. Logo aos primeiros ensaios, receberam uma proposta do sr. João Dummar, diretor do Ceará Rádio Clube, para fazer uma temporada de 30 dias, naquela emissora, isto em janeiro de 1941. Diante do sucesso dessa temporada, combinaram voltar ao Rio, não só para estudar, como também para ver se conseguiam, desta vez, ingressar no "broadcasting" carioca.

Ao microfone da Rádio Cruzeiro do Sul, num programa de Aylton Flores, apresentou-se, então, pela primeira vez no Rio, o quinteto "Bando Cearense" ou "Quatro Ases e Um Melé", conforme os batizou o jornalista cearense Demócrito Rocha, já falecido. Depois de três audições seguidas foram convidados a um teste na Rádio Mayrink Veiga, onde esperavam ser contratados.

Agradaram plenamente, mas... o contrato estava demorando e era preciso trabalhar. Já estavam meio apreensivos, quando surgiu novamente o Sr. João Dummar, que aqui viera a negócios. Encontrando-os fez a apresentação do conjunto ao Sr. Teófilo de Barros Filho, riscou o "Bando Cearense" e aproveitando o nome de "Quatro Ases e Um Melé", transformou-o em "Quatro Ases e Um Coringa", modificação essa que vem a dar no mesmo, pois, no Norte, "melé" e "coringa" tem o mesmo significado.

Depois de vários programas, vieram as primeiras gravações e, consequentemente, os primeiros sucessos. Quem não se lembra de: "Eu vi um leão", "Sá Mariquinha", "Baião", "Onde estão os tamborins", "É com esse que eu vou" e tantas outras músicas do repertório desses vitoriosos rapazes? Depois de atuarem durante três anos na Rádio Tupi, receberam e aceitaram uma vantajosa proposta da Rádio Nacional, onde até hoje permanecem.

O cartaz dos Quatro Ases e Um Coringa já estava assegurado, por isso começou a chover propostas para excursionarem. Percorreram vários Estados do Brasil, atuando sempre nas melhores boates e nos melhores cassinos. No exterior, obtiveram grandes sucessos em Santiago do Chile e em Buenos Aires.

Evenor, 33 anos, casado, uma filha de 4 anos, químico industrial e gosta muito de cinema. Permínio, 29 anos, solteiro, perito contador e oficial da reserva, é francamente do futebol e torcida renitente do Flamengo. José, 28 anos, casado, com um filho de 4 anos, perito contador e oficial da reserva, gosta de leitura e pratica vários esportes. Pijuca, 28 anos, casado, filhos (ainda é cedo), perito contador e gosta de resolver problemas bem intrincados. Coringa, 29 anos, solteiro, não concluiu os estudos, mas, em compensação, dizem que é um excelente "catedrático" em matéria de corridas de cavalos...

Pelo que apuramos, não resta a menor dúvida de que o maior desejo de todos os componentes dos Quatro Ases e Um Coringa é levar nossa música, e torná-la mais conhecida ainda, nos Estados Unidos da América do Norte e por toda a Europa. Bela aspiração a desses cinco jovens, que o Brasil inteiro conhece e tanto admira!"

Fotos: "A rapaziada dos 4 Ases e 1 Coringa está sempre alegre e bem disposta. Aqui três flagrantes dos guapos cearenses, tirados na praia de Copacabana numa tarde de calor."

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Fonte: Revista do Rádio - Dezembro de 1949