Manuel Bandeira, um dos nossos maiores cronistas, acaba de publicar um interessante volume, "Chronicas da Província do Brasil" que é um agradável passeio entre as letras, as artes e recantos pitorescos da terra brasileira. O livro de Manuel Bandeira tem dois capítulos sobre João Baptista da Silva, o popularíssimo Sinhô.
O do enterro do autor de "Jura" é uma página sugestiva das mais curiosas do livro. Transcrevemos, nesta página, o outro capítulo, sob o título "Sambistas", em que o cronista narra um caso pitoresco e complicado de investigação da paternidade de um samba:
"Quando morreu o afamado Sinhô, escrevi para o "Diário Nacional" de São Paulo uma crônica em que recordava com saudade alguns traços curiosos da figura do rei do samba carioca. E contei uma cena a que tive o prazer de assistir em casa dos meus amigos Eugênia e Álvaro Moreyra.
Foi o caso que numa das extintas deliciosas quintas-feiras em que o casal recebia, apareceu o Sinhô e regalou os convidados não só com a sua conversação como com os seus sambas. Estava mal de voz, tossia muito (era a velha tuberculose que apertava o cerco), mas nenhum de nós teve a menor ideia de atribuir aquela tosse à terrível moléstia e, como era do mais elementar dever, poupar o doente.
O que nos desculpa daquela “descaridade” é que Sinhô para toda gente era uma criatura fabulosa, vivendo no mundo noturno do samba, zona impossível de localizar com precisão - é no Estácio mas bem perto ficam as macumbas do Encantado, mundo onde a impressão que se tem é que ali o pessoal vive de brisa, cura a tosse com álcool e desgraça pouca é bobagem. Assim quando Sinhô parava num acesso, ia-se buscar uma boa lambada de Madeira e o fato é que a tosse é que a tosse passava.
A acreditar no Sinhô, ele não tinha dormido na noite da véspera. Passara-a numa farra, e naquela manhã mesmo, ao regressar a casa, não fora bem recebido pelo seu bem, que naturalmente estava ralado de ciúmes.
Contou Sinhô que foi então para o piano e improvisou um samba, que entoou para nós ainda com as hesitações das coisas inacabadas. Era gostosíssimo e parecida do melhor Sinhô. (Ninguém duvidou que não fosse dele.) Lembro-me bem da toada e da letra do estribilho:
Já é demais,
Meu bem, já é demais!
Eu já notei que tu queres me acabar...
Fizemos o Sinhô repetir a toada um sem-número de vezes. Todos os presentes já o sabiam de cor e secundavam em coro quando chegava a hora do "já é demais". Foi isso em fins de 1929.
***
Há pouco mais de um mês um amigo meu, que se interessa atualmente por modinhas policiais, pediu-me umas informações, e para servi-lo andei correndo os olhos na literatura de cordel. Fui à toa à Praça Tiradentes onde, sob as arcadas do antigo São Pedro, havia um vasto estenderete do gênero. O café da esquina da Rua das Marrecas estava em demolição. Mas passando por lá de bonde verifiquei que nos andaimes da reconstrução os cordelinhos de engraxate resistiam bravamente à poeira. Lá pude arranjar uma pequena coleção de "liras" que remontavam até 1927.
Vim para casa e correndo a vista por aquelas páginas sujíssimas deparei num dos cadernos com o título "Já é demais". Abaixo dele vinha a informação: "Letra e música de seu Candu". Ora, lá estava o estribilho do samba de Sinhô:
Já é demais, meu bem,
Meu bem já é demais!
E hoje já notei
Que tu queres me acabar...
Verifiquei logo que o plágio não podia ser de seu Candu, porque a publicação era de 1927 (editor Menotti Carnaval, depósito Rua General Pedra, 169) e de resto havia ainda a indicação abaixo do título de que o "Já é demais" era choro do carnaval de 1925, o que estava aliás provadíssimo pelo contexto da letra todo cheio de alusões aos fatos revolucionários de 1924:
Lá no morro de S. Carlos
É lugar de pretensão.
Já botaram metralhadoras
Pra brigar com aviação.
Ainda não pude descobrir quem conhecesse a toada do choro do seu Candu. Em todo o caso está claro que Sinhô avançou no refrão de seu Candu.
***
Isso tudo me fez refletir como é difícil apurar afinal de contas a autoria desses sambas cariocas que brotam não se sabe donde. Muitas vezes a gente está certo que vem de um Sinhô, que é majestade, mas a verdade é que o autor é seu Candu, que ninguém conhece.
E afinal quem sabe lá se é mesmo de seu Candu? Possivelmente atrás de seu Candu estará o que não deixou vestígio de nome no samba que toda a cidade vai cantar. E o mais acertado é dizer que quem fez estes choros tão gostoso não é A nem B, nem Sinhô, nem Donga: é o carioca, isto é, um sujeito nascido no Espírito Santo ou em Belém do Pará."
Fontes: "Carioca" - Edição 77, de 10/4/1937; Yahoo Grupos: transcrição de Maria do Carmo - "In" Manuel Bandeira - Poesia Completa e Prosa, Editora Nova Aguilar S.A., RJ, 1983, págs. 463/465 (texto revisado).
quinta-feira, maio 29, 2014
Olga Praguer para os fãs do rádio
"Olga Praguer Coelho é uma das primeiras figuras do rádio no Brasil. A sua atuação frente aos microfones brasileiros data dos primeiros tempos da Rádio Sociedade.
Tem cantado em quase todas as estações do Rio, sendo atualmente exclusiva da Rádio Tupy.
Fora do Brasil, Olga Praguer tem cantado em inúmeros países: Argentina, Uruguai, Itália, Alemanha, Áustria, etc., mostrando a todo mundo, o que realmente belo possui o folclore brasileiro, de que é uma intérprete inigualável.
Tem apresentado e criado com grande sucesso um sem número de músicas, entre as quais, as suas adaptações de antigas modinhas imperiais e o "Canto da Expatriação", de Humberto Porto, gravado com o tenor mexicano Pedro Vargas."
Fonte: "Carioca", de 8/4/1937 (texto atualizado e foto).
Tem cantado em quase todas as estações do Rio, sendo atualmente exclusiva da Rádio Tupy.
Fora do Brasil, Olga Praguer tem cantado em inúmeros países: Argentina, Uruguai, Itália, Alemanha, Áustria, etc., mostrando a todo mundo, o que realmente belo possui o folclore brasileiro, de que é uma intérprete inigualável.
Tem apresentado e criado com grande sucesso um sem número de músicas, entre as quais, as suas adaptações de antigas modinhas imperiais e o "Canto da Expatriação", de Humberto Porto, gravado com o tenor mexicano Pedro Vargas."
Fonte: "Carioca", de 8/4/1937 (texto atualizado e foto).
Leny Eversong e sua carreira artística
"Leny Eversong é uma artista que se firmou na radiofonia nacional em menos tempo do que todos, inclusive ela própria, esperavam. O foxtrote tem em Leny uma grande admiradora e uma fiel intérprete. Parece que a nova estrela do "broadcasting" da Cidade Maravilhosa estudou psicologia da música negra norte-americana. E fez-se professora ...
Seu verdadeiro nome é Hilda Campos Filgueras. Nasceu na capital de São Paulo. Casou-se com Alvinho Filgueras, outro animador do rádio brasileiro, criador do grupo radiofônico "Os Namorados do Ar", de Santos.
Leny Eversong descobriu muito cedo os seus pendores para o canto. Aos treze anos de idade já cantava alguma coisa. Mas então nem sequer em sonhos ela cogitava de vir a enfrentar um microfone.
Cantou pela primeira na PRB-4, de Santos. Ali se conservou o tempo necessário para adquirir mais impulso e maior anseio. Procurou sempre interpretar músicas norte-americanas. Começou cantando-as em tradução. Depois no original. Seu pseudônimo já começava a ficar conhecido. Resolveu ir para a PRG-5, Rádio Atlântica, na mesma cidade paulista. Com isto pode-se dizer que ela correu todas as estações de Santos.
Na Rádio Atlântica se firmou definitivamente. Era intérprete número um da melodia norte-americana. Foxes, blues, rag-times ...
Por ocasião da visita da embaixada de artistas cariocas composta por Almirante, Castro Barbosa, Jayme Britto e o Conjunto Regional de Benedito Lacerda àquela estação emissora, Leny cantou em sua homenagem. Os artistas chegados do Rio retribuíram, tendo Castro Barbosa mostrado as suas possibilidades, secundado pelo Conjunto Regional de Benedito Lacerda, com este na flauta, Russo no pandeiro, e o resto ...
Chegado ao Rio, o Conjunto de Benedito Lacerda notificou a direção da Tupy sobre a arte de Leny Eversong. E como Carlos Frias ia para Santos, a PRG-3 aproveitou a sua viagem para chamá-la. Leny não demorou muito a chegar ao Rio de Janeiro.
A entrevista que Leny Eversong concedeu a CARIOCA resultou numa palestra agradável e interessante, de acordo com a própria artista.
— Que pensa do rádio? E do ouvinte?
— Penso que o rádio é um grande invento. Um formidável invento.
Ele auxilia muito o artista. Torna-se um propagandista ligeiro e mais eficaz do qualquer outro ... Quanto ao ouvinte acho que é muito camarada da gente e é muito gentil. É assim como um espírito invisível benéfico para nós, pois ele é uma das coisas que fazem com que o artista progrida para fazer jus a uma boa e contínua recepção ...
Um dos grandes anseios de Leny Eversong é entrar para o cinema brasileiro. Acha que a cinematografia nacional tem um brilhante futuro, pois começou pelos primeiros passos ... Este e o de ser grande estrela de rádio para seu nome alcançar fama em outros países do mundo, são os seus maiores anhelos (anseios). Julga assim que sua ambição não é incomensurável ...
— Quais as músicas que mais aprecia cantar?
— Em primeiro lugar gosto de cantar foxtrotes. Em geral a música dos negros norte-americanos. Parece que não, mas o ritmo destas melodias faz fremir o âmago da gente ... O meu compositor predileto é Duke Ellington. De vez em quando, porém, canto sambas e outras músicas do folclore brasileiro ... lá em casa, geralmente. Eu gostaria de aprender a interpretar tuto, tudo ...
E não está longe disso. Sua voz é um problema cheio de saídas. Pois se ela não só canta com voz humana como até imita instrumentos musicais! Quando está mais animada consegue uma perfeita imitação do sopro do pistão e do argênteo som da guitarra de Havaí! Já está apta a fazer os próprios acompanhamentos. E sem bateria ...
— Em que procura distrair-se?
— Eu estou sempre distraída, com franqueza. Quando não estou cantando, toco piano, repinico num violão qualquer coisa ... Gosto de pintura. Pinto em toda a parte, fundo de prato, quadros, almofadas ... Também gosto de ir ao cinema e ao teatro assistir a revistas. Leio semanalmente as seções de rádio e cinema de CARIOCA.
— Quais as suas novidades para o corrente ano?
— Por enquanto não posso afirmar nada. Tenho diversas propostas de contratos em vista para ir atuar nos rádios do sul. Talvez eu vá para a Argentina, talvez não ... Vou pensar ... Na Tupy espero lançar, paulatinamente, perto de duzentos foxes que ainda restam no meu repertório ..."
Fonte: CARIOCA, de 13/3/1937 (texto atualizado e foto de Leny, provavelmente com 17 anos)
A viagem de Sylvinha Mello
"A attracção do cinema - Um film dramatico que será produzido no Ceará" (Carioca, de 13/3/1937) |
"A pouco e pouco o nosso meio radiofônico está perdendo os seus ases ante o evidente progresso do nosso meio cinematográfico. Quando começou a se firmar o cinema na nossa terra, quando ele se mostrou mesmo com grandes tendências para uma perfeição pouco longínqua, os artistas do nosso rádio e do nosso teatro abandonaram céleres, as suas precedentes ocupações e se passaram para a tela prateada. Alguns gostaram. E ficaram. Outros gostaram. Mas não ficaram ...
O teatro cede muito elementos para o cinema, mas o rádio não lhe fica atrás. O rádio é um intermédio. Os artistas saem do teatro para o rádio, deste para o cinema. Adquirem, assim, ao microfone, a dicção necessária para uma boa película.
Sylvinha Mello começou muito bem no rádio. Tem uma voz agradável e um jeito todo especial para cantar canções. E é dona de agradabilíssimo palmo de face. É justo, pois, que o cinema a seduzisse. E seduziu-a mesmo.
Quando Raul Roulien organizou o elenco de artistas que seriam filmados na sua primeira produção brasileira "O Grito da Mocidade", não se esqueceu de dar um pequeno papel a Sylvinha Mello. E ela agradou bem na parte que lhe coube. Além de ser muito elegante, demonstrou possuir grande parte do jeito comediógrafo de que todos nós temos uma parte ...
Sylvinha Mello gostou do cinema e o cinema gostou de Sylvinha Mello. Mas ela não abandonou definitivamente o "broadcasting". O cinema ainda não é aqui no Brasil uma segura e contínua colocação.
A conhecida intérprete do nosso folclore veio, afinal, a ser contratada pela PRE-8, Rádio Nacional. Seu desempenho neste emissora era muito bom. Sua expressão, ótima. Ela continua a cantar no rádio com a sua voz bonita. E a agradar a quem a vê com a sua figura graciosa.
Agora, Sylvinha Mello voltou para o cinema. Enfim, o cinema a chamou de novo, para celebrizar quiçá como estrela de primeira grandeza. Ela deve partir dentro destes dias para o Ceará, disposta a ser filmada numa nova produção cinematográfica brasileira. A companhia que a convidou, uma sociedade americana de cinematografia, vai tentar mais um sucesso na nascente indústria cinematográfica brasileira. Sylvinha Mello vai tentar mais uma vez um outro sucesso em frente da câmera. Se desta vez ela desempenhar com apuro o seu papel, é quase certo que mais cedo ou mais tarde deixará mesmo o rádio de parte.
Todos os artistas têm grandes aspirações. Quem não vai gostar é o radiouvinte exclusivo de Sylvinha Mello ..."
Fonte: CARIOCA, de 13/3/1937 (texto atualizado e foto).
segunda-feira, maio 26, 2014
A marcha chinesa que dominou um carnaval
De todas as músicas surgidas para os próximos festejos de Momo, só uma conseguiu um sucesso fulminante até agora: -- é a marcha chinesa "Lig-Lig-Lig-Lé", de Paulo Barbosa e Oswaldo Santiago.
Em poucos dias, mal as estações de rádio começaram a rodar o disco, esgotava-se o primeiro milheiro de partes de piano e outro tanto de chapas fonográficas.
Na época que corre, em que a vendagem decaiu de forma desoladora, "Lig-Lig-Lig-Lé", parece destinada a um recorde de bilheteria, como se diz em linguagem de teatro e cinema.
"Lig-Lig-Lig-Lé" foi gravada em discos por Castro Barbosa, o cantor que gravou "O teu cabelo não nega".
Fontes: "O Malho", de 7 de janeiro de 1937 (artigo e foto); Youtube.
Em poucos dias, mal as estações de rádio começaram a rodar o disco, esgotava-se o primeiro milheiro de partes de piano e outro tanto de chapas fonográficas.
Na época que corre, em que a vendagem decaiu de forma desoladora, "Lig-Lig-Lig-Lé", parece destinada a um recorde de bilheteria, como se diz em linguagem de teatro e cinema.
"Lig-Lig-Lig-Lé" foi gravada em discos por Castro Barbosa, o cantor que gravou "O teu cabelo não nega".
Lá vem o seu China / Na ponta do pé
Lig lig lig lig lig lig lé!
Dez tões, vinte pratos / Banana e café
Lig, lig, lig, lig, lig, lig, lé!
Chinês / Come somente uma vez por mês
Não vai / Mais a Xangai / Buscar a Butterfly
Aqui, com a morena / Fez a sua fé / Lig, lig, lig, lé!
Fontes: "O Malho", de 7 de janeiro de 1937 (artigo e foto); Youtube.
sábado, maio 17, 2014
Baptista Júnior e sua família Resmungo-Chorão
"Baptista Júnior, o grande ventríloquo brasileiro que todos os aficionados do teatro conhecem e todos os fãs do rádio estão agora conhecendo, em qualquer meio em que exerça as suas faculdades de artista se torna logo querido.
Muito tempo ele se exibiu nos palcos nacionais, arrancando aplausos da plateia. Seus bonecos a que ele dá o dom da palavra e dom do humor, tornaram-se o ídolos das crianças de cinco a cinquenta anis. No mês que passou, Baptista Júnior foi contratado pela PRE-8, Rádio Nacional, onde atuou aos domingos com toda a sua família de bonecos, com toda a família Resmungo-Chorão. E isto lhe granjeou muito mais admiradores de sua arte de ventríloquo, ficando ele famoso não só no teatro como no rádio também.
Foi mais um passo gigantesco na vida de sucessos desse artista e mais um pulo na vida não menos cheia de sucessos de toda a companhia dos Resmungo-Chorões.
CARIOCA procurou ouvir a palavra de Baptista Júnior sobre essa sua mudança de setor artístico e sobre algum caso pitoresco de sua vida. E ouvir, também, a palavra dos bonecos falantes ...
Baptista Júnior mora no Catete, com sua família. E aí o fomos procurar. Tivemos, então, a agradável surpresa de encontrar em casa as irmãs Linda Baptista e Dircinha Baptista, filhas do grande ventríloquo, e, como ele, agora animadoras do nosso broadcasting. Cumprimentos.
— Como vai a família Resmungo-Chorão?
— Bem, obrigado. Ela não sente calor, não adoece. E, se não fosse o Joãozinho poderia dizer que não reclama de nada. Mas o Joãozinho reclama a toda a hora ...
— Pois vamos conhecer o pessoal.
Imediatamente Baptista júnior foi acordar os três principais membros da família. São eles o Joãozinho, o Juquinha e o Benedito. Logo que sentiu sua cabeça em cima dos ombros o Joãozinho nos fuzilou com o olhar. O Juquinha é o mais santo da turma. Menino obediente, simpático, faz tudo o que o seu mestre manda. Benedito tem um caráter muito complexo. Catadura feroz, um pedaço de pau na mão, mas não parece mau rapaz. Não há dúvida que o mais traquinas é o Joãozinho, o Chorão. O mais traquinas e o mais mal educado.
Antes de interrogar os bonecos e depois de tirar umas fotografias, conversamos com Baptista Júnior.
— Quantos anos de teatro?
— Antes de ventríloquo eu me iniciei no gênero caipira. Foi insto ainda quando eu era solteiro. Há 19 anos pouco mais ou menos. Desde então senti o gosto pelo teatro ...
— Quando foi que descobriu a sua faculdade de ventríloquo?
— Isso é uma história. Só depois de casado. E por um fortuíto acaso. Foi há 16 anos. Minha filha Linda tinha apenas três meses de idade. Ora, certa vez, brincando com ela, procurei imitar suas respostas às minhas perguntas. E logrei sucesso. Então comecei a falar sem mover os lábios. A ventriloquia é um dom natural, porém, precisa de treinos e ensaios. Finalmente, brincando ainda com a Linda, eu lhe tocava o estômago e falava por ela. A título de brincadeira chamei minha esposa e lhe disse que a nossa filha, somente com três meses, já dizia "papai", "mamãe" e "titio". Foi um alvoroço lá em casa. Todos queriam ver a menina-prodígio. Minha esposa levou um susto enorme. E foi um custo eu serenar os ânimos ...
— E desde aí o senhor aproveitou ser ventríloquo para engrandecer ainda mais o teatro?
— Exatamente. Mas então eu apenas tinha uma única segunda voz correta. Fui treinando até conseguir selecionar diversas vozes. Hoje em dia consigo nove vozes diferentes ...
— Como criou a sua companhia?
— A pouco a pouco. Recordo-me que o primeiro boneco feito por mim se chama Bastião. Era um preto muito engraçado. Até hoje guardo a sua cabeça como recordação ...
É interessante notar aqui que Baptista Júnior em pessoa fabrica os seus bonecos, para o que tem uma verdadeira oficina de mecânico em casa. Além disso ele próprio compõe o repertório anedótico da família Resmungo-Chorão. Desta forma os bonecos, embora não tenham vida como se fossem de carne e osso, dão mais trabalho ao mestre do que se a tivessem. Obrigam-no a uma lufa-lufa incessante e ainda por cima resmungam contra tudo e contra todos ...
— Quais os seus bonecos mais queridos?
— Eu gosto de todos em geral. Se não gostasse não os teria fabricado. Mas, verdadeiramente, aprecio mais o Joãozinho, o Juquinha e o Benedito, estes três. Eles são as figuras de proa da família toda. Isto, porém, não quer dizer que eu não simpatizasse com os outros ... Se não fosse o conjunto a família não teria tanta graça.
— E o que pensa do teatro e do rádio? Acha que eles têm algum ponto análogo entre si?
— Certamente. Parecem-me muito. Mas eu, agora, tenho a convicção de que o rádio é mais difícil de lidar do que o teatro. Por causa da voz. No teatro basta uma voz medíocre para ter efeito. No rádio, não. É preciso mais técnica para se conseguir o efeito desejado. Quero dizer com isto que qualquer pessoa pode ter sucesso no teatro enquanto que no rádio só um número muito restrito ...
— E está satisfeito com o rádio?
— Muito. Embora o ouvinte não possa apreciar de "de visu" os meus bonecos, as vozes que eu lhes dou devem servir para mostrar que eu já as posso selecionar perfeitamente. Isto obriga a mais trabalho artístico, mas por outro lado me faz adquirir outros conhecimentos dispensáveis ao teatro. A mímica que eu, no palco, lhes dava, por exemplo, auxiliava muito a expressão adequada para a cena. No rádio só posso me apoiar no diálogo. Por isto o rádio é mais difícil. E por isto eu fiquei satisfeito com ele ...
— Espera para breve alguma novidade no seu programa da Rádio Nacional?
— A única novidade digna de nota é o aparecimento do meu novo personagem, o boneco japonês. Depois deste mais virão, mas por ora apenas o japonês monopoliza minha atenção. Ele deve ser bem recebido pelo público ouvinte. É inimigo fidagal do Chorão. Aliás o Chorão tem diversos inimigos por causa do seu caráter rixento ... Este novo boneco japonês, chama-se Kutuka-Na-Kara. E não quero dizer mais nada ...
— Muito bem. Consigo era só o que tínhamos a falar. Agora vamos bater uma chapa da família Resmungo-Chorão almoçando e perguntar umas tantas coisas a um dos componentes dessa encrencada família ...
Tirada a fotografia, tentamos receber algumas respostas de Benedito e do Juquinha. Infrutiferamente. O primeiro deu a entender que não gostava de entrevistas, brandindo o seu cacete perigosamente. O segundo, menino educado, preferiu o silêncio. Como não havia alternativa, pois o novo boneco japonês ainda se achava recolhido ao leito, dirigimos a palavra ao Joãozinho, o Chorão, do seguinte modo:
— Quantos anos tem você?
— Oito anos, — respondeu.
— Oito anos? Já está um mocinho ...
— É ...
— Mas por que você não cresce?
— Não. Eu nasci com oito anos. Não cresço, porque não quero.
— Não quer?
— Não.
— E por que você de vez em quando abre a boca e chora como um desesperado?
— Porque gosto. É ...
— Você gosta dos ouvintes?
— Não.
— Não gosta dos ouvintes, Joãozinho?
— Não; gosto mas é das ouvintes. Tem cada pequena boa ...
— Quando você foi falar pela primeira vez no microfone não teve medo?
— Tive.
— O que lhe aconteceu?
— Tive uma tremedeira ... Mas agora me acostumei e não tenho mais tremedeira, não. É ...
— Bem, Joãozinho, nós vamos embora. Se quiser enviar alguma saudação aos ouvintes, nós a levaremos ...
— Não. Eu envio pessoalmente ...
Estava finda a nossa missão. Antes de sairmos, porém, ainda fotografamos um conjunto composto por Baptista Júnior, seus principais bonecos, Dircinha e Linda Baptista. Depois nos despedimos do grande ventríloquo, de sua família e da família Resmungo-Chorão.
Quando já íamos na rua, Joãozinho, o Chorão, avisou:
— Olhe, moço. Veja se os retratos me favorecem. Não é por nada, mas eu não quero que me chamem de feioso... É ..."
Fonte: Semanário CARIOCA, de 13/3/1937 (fotos desta revista e artigo atualizado).
A atividade dupla de Henrique Batista
Henrique Batista - Carioca, 6/3/1937 |
— Professor Baptista!
— Boa noite ...
Eram oito horas da noite. Muito movimento na rua. O repórter entrou. Abancou-se à mesa. Papel. Lápis.
— Desejava resposta a umas tantas perguntas ...
— Relacionadas com ...?
— "Maria Bonita", rádio ...
— Estou, infelizmente, com muita pressa. Mas posso conceder-lhe cinco minutos ...
— É muita bondade ... Olhe-me, contento-me com quatro perguntas. Pode até fiscalizá-las ...
— Estou de acordo se forem apenas quatro. Farei o possível por lhe ser agradável.
O professor Henrique Baptista é irmão da conhecida intérprete de sambas Marília Baptista. E, como esta, também ele fez parte do elenco de artistas que aparecerem na filmagem "Maria Bonita" em "location" em Barra Mansa e atua no rádio carioca, dirigindo dois programas, um na Rádio Transmissora, outro na Rádio Educadora. Aliás ele e sua irmã sempre trabalham juntos em todos os setores da atividade radiofônica, constituindo mesmo uma dupla de sucesso no concernente a desafios e improvisos. Aquele interessante programa de improviso "É de babado ..." é de criação da dupla. E agora, com o temporário afastamento de Noel Rosa do nosso "broadcasting", ficando Patrício Teixeira parado, a dupla Henrique-Marília Baptista é a única nesse gênero de irradiação.
— Como foi a filmagem de "Maria Bonita"? -- perguntou o repórter.
— Eu cheguei de Barra Mansa na semana passada para não faltar ao meu programa radiofônico da Educadora, todas as quintas-feiras. Marília veio comigo. A rodagem das nossas partes no filme terminaram no mesmo dia. E desde aí ficamos mais ou menos livres ... Você quer que eu lhe diga como foi tudo: foi esforçada e foi bem dirigida por Julien Mandel. Não tive oportunidade de ver nenhuma prova da película, porém, assisti a algumas encenações e as achei muito boas.
— Diziam qua a principal protagonista feminina seria sua irmã, mas na verdade ...
— Não, não foi minha irmã. Aliás CARIOCA não se guiou pela voz corrente. Não foi minha irmã. E não estaria direito se o fosse. Ela é uma principiante, como sabemos, e embora se esforçasse muito não estaria ainda adaptada ao meio cinematográfico para lograr o grande êxito desejado por Mandel, como heroína de seu primeiro filme. A figura principal, Eliana Angel, é boa artista. Marília, no entanto, cantou um samba que deve agradar quando aparecer "Maria Bonita". Quanto a mim faço o papel de profeta ...
— E por isso usa estas barbas?
— Sim, fui obrigado a deixar crescer a barba. Onde se viu um profeta que se preza sem ela bem comprida e esvoaçante? Quando se é profeta, pelo menos e, filme, o apuro pessoal fica de lado ... Mas é como eu lhe estava dizendo. "Maria Bonita" deve agradar. A cotação que eu dou a esse filme, à parte de quaisquer interesses, é boa. Julien Mandel fez da obra literária de Afrânio Peixoto, uma obra cinematográfica à altura da fama e dos méritos que ele, Mandel, tem nos nossos meios artísticos. A rodagem geral da película deve ter terminado quinta-feira. E é muito provável que já em meados de abril ela possa ser exibida na Cinelândia. A respeito de "Maria Bonita" é só o que tenho a dizer ...
O repórter fez a sua terceira pergunta:
— Acerca do rádio?
— Agora estou outra vez numa atividade mais ampla. Antes eu tinha dupla ocupação e dupla preocupação, aos pulos, aqui e em Barra Mansa. A filmagem de "Maria Bonita" obrigou-me a um regular esforço. Mas creio bem que me sai ... assim ... assim ... da prova -- pelo menos envidei toda a minha boa vontade no sentido de não perder o gosto pelo cinema. De retorno ao rádio tenho a declarar que prossigo, aos domingos, no "Programa Casé" da Transmissora, e às quintas-feiras no "Sambas e outras coisas ..." da Educadora. Estou contente com o caráter, embora ainda pouco definido, que as coisas de rádio estão tomando esse ano. Todo mundo fala em novidades, em originalidades, em grandes empreendimentos ...
— E você também quer falar?
— Nem por isso. Talvez eu tenha muita coisinha passável por dentro do cérebro, mas por enquanto vou deixar tudo como está para evitar aborrecimentos. Marília continua comigo em todos os programas em que atuo e dirijo. E sei que ela vai lançar, brevemente, um novo repertório de sambas ...
— Pode me informar mais alguma coisa, coisa concreta, sobre esse repertório?
— Não, porque isso não se refere diretamente a mim, e além disso já passaram os cinco minutos que eu lhe concedi. Com a agravante desta sua última pergunta já deve ser a quinta ...
— Mas não pode ...
O professor Henrique Baptista levantou-se e apertou rapidamente a mão do repórter. Tinha um olho neste e o outro no relógio.
— Você está enganado pelas minhas barbas compridas, rapaz. Eu, na verdade, não sou profeta, nem de Cascadura ...
Cofiou a barbaça e ... desapareceu.
Fonte: Revista Semanal CARIOCA, de 6/3/1937, no artigo "Cinco Minutos com o Propheta" (texto atualizado).
quinta-feira, maio 15, 2014
A volta de Ivete Canejo
Yvette Canejo - Carioca de 27/2/1937 |
A sua ausência dos microfones cariocas que tanto vinha inquietando os seus fãs, parece que terá fim: Ivete chegou há dias do Sul, onde estava cantando na PRF-9 e voltará dentro de breves dias para uma das nossas emissoras.
Ivete gostou de Porto Alegre. Divertiu-se e cantou muito. Levou aos gaúchos o samba carioca que ela, como poucas, conhece.
Com Moreno da Silva, um dos cantores mais populares do Rio, apresentou alguns sucessos cariocas que se transformaram em autênticos êxitos locais. "Cadê o toucinho", foi a música que mais agradou ao público gaúcho:
— Diariamente — diz-nos Ivete, Moreira da Silva e eu, éramos obrigados a cantá-lo, pois os pedidos telefônicos e pessoais não paravam. A música de Nássara, conseguiu, pois, um autêntico e completo triunfo.
— Que impressão trouxe do Sul?
— Gostei imensamente. Porto Alegre é uma cidade moderna e encantadora. Em cada habitante encontramos um amigo. As gentilezas para conosco foram tantas, que se torna difícil enumerá-las.
— Sobre o ambiente radiofônico?
— Os colegas locais, bons camaradas. Sobre os valores, não há nomes a destacar. Direi apenas que há gente boa e capaz de fazer sucesso no Rio.
— Quem lhe agradou mais? — insistimos.
— Há uma menina que na minha opinião é a mais interessante das artistas de Porto Alegre. Chama-se Zilda Bueno e canta com muito jeito, os sambas e as marchinhas tão de gosto dos cariocas. Em palco ela é um autêntico sucesso e, nos festivais que realizamos, Zilda foi um dos elementos destacados: tem muita vida e muita cadência. Chamam-na de Shirley Temple brasileira.
— E, agora, quais são os seus projetos?
— Voltarei para uma das nossas emissoras, para o que já tenho propostas em estudo e talvez, em junho, realize outro passeio ao Sul — concluiu Ivete, sorridente."
Fonte: Revista Semanal CARIOCA, de 27/2/1937 (texto atualizado mais a foto).
domingo, maio 11, 2014
Moreira da Silva gostou do Sul ...
Foto: CARIOCA, 20/2/1937 |
"Arrasta a sandália, aí, morena!
Arrasta a sandália, aí, morena!
Quem não se recorda deste samba de grande sucesso de 1933? E mais tarde:
Implorar
Só a Deus
Mesmo assim
Às vezes não sou atendido ...
Dois autênticos sucessos do passado e as duas maiores criações de Moreira da Silva, um cantor conhecido do público carioca e que felizmente não figura nos calendários radiofônicos ao lado dos "medalhões" ...
Moreira da Silva é o mais carioca dos cantores da cidade. Como nenhum outro, através do ritmo de um samba, ele sabe contar a simplicidade da vida dos nossos morros e de seus habitantes.
Artista original, como poucos do nosso broadcasting, Moreira vai lançar uma série de sambas novos, tipo "Jogo proibido", todos ainda desconhecidos do público carioca.
Há muito, porém, ele não se apresenta frente aos microfones cariocas. Porto Alegre com seus encantos e o seu público sempre acolhedor, prendeu-o por mais de um mês. Lá, segundo o testemunho dos jornais locais, o seu sucesso foi grande. "Cadê o toucinho?", "Vara criminal", "Trabalho me deu o bolo" e outras músicas genuinamente cariocas e 100 por cento Moreira da Silva, foram verdadeiros sucessos na PRF-9, Rádio Difusora de Porto Alegre.
Moreira é amigo de CARIOCA. Chegando ao Rio, tivemos logo a primazia de sua visita. Mostra-se encantado com o que viu e com a recepção que teve:
— Porto Alegre é uma cidade linda. Tem passeios encantadores e uma população amabilíssima com os artistas cariocas. Tivemos, Joel e Gaúcho, Ivette Canejo e eu, uma recepção, sob todos os aspectos, magnífica. Tantas foram as gentilezas que, nem sei como agradecer. Apenas em Porto Alegre há uma coisa que não me agradou: os mosquitos ... No dia que a Prefeitura resolver acabar com eles, creio que a capital rio-grandense será uma verdadeira sucursal do Paraíso ...
— E o ambiente radiofônico?
— O "pessoal" é igual. Há um sambista interessantíssimo: Lupiscínio Gonçalves (1). Algumas composições dele já são conhecidas do Rio. Trago, porém, comigo, outras inéditas, que serão lançadas brevemente.
Fazia-se tarde. Moreira já de pé se retirava, quando lançamos a última pergunta:
— E agora, que vamos fazer?
— Voltar para o Sul dentro de breves dias ...”
(1) Equívoco da reportagem ou de Moreira? Ele provavelmente falava de Lupicínio Rodrigues ou de Alcides Gonçalves, a dupla de compositores gaúchos.
Fonte: Revista Semanal CARIOCA, de 20/02/1937.
quinta-feira, maio 08, 2014
Xerém
Xerém (Pedro de Alcântara Filho), compositor e cantor, nasceu em Baturité, Ceará, em 5/8/1911, e faleceu no Rio de Janeiro em 1982. Seu pai foi maestro na Marinha, influenciando-o a seguir a carreira artística. Foi o primeiro compositor a utilizar a palavra "forró" em uma composição, sendo, por essa razão, considerado por muitos como o pai do forró.
A partir de 1926 apresentou-se em circos e teatros pelo Brasil, integrando a "Trupe de Crianças Pequenas Edson", formada por seu pai. Em 1937 veio para o Rio de Janeiro com a irmã Nadir, com quem formava a dupla Xerém e Tapuia. Apresentaram-se inicialmente na Rádio Tupi e posteriormente foram efetivados no programa "Festa na roça", apresentado pelo Capitão Furtado.
Em 1937 gravaram o primeiro disco, cantando Quadria no arraiá, de Xerém e Pequeno Edson, e o choro Forró na roça, de Xerém e Manoel Queiroz.
A partir de 1939 passou a formar dupla com Bentinho, que cantara durante algum tempo com Alvarenga. No mesmo ano, a dupla gravou o primeiro disco cantando a moda de viola Chapéu das moças, de Xerém e Bentinho, e a rancheira Mariquita de Pequeno Edson. A dupla apresentou-se no programa de César Ladeira, na Rádio Mayrink Veiga, onde lançou várias músicas.
Em 1941, a cantora Araci de Almeida gravou Mamãe baiana, parceria de Xerém e Joraci Camargo.
A dupla Xerém e Bentinho lançou diversos discos, principalmente pela RCA Victor, como o calango Avoa jacutinga, de José Alves Torres, e a moda de viola Moda do casamento, de Xerém e Bentinho.
Em 1943, Xerém passou a fazer dupla com De Moraes, com quem gravou, em junho de 1944, a marcha Lá vai balão, de Xerém e Pequeno Edson, e a valsa Saudades de Marianinha, de De Moraes. No mesmo ano, Xerém participou do filme Abacaxi azul de J. Rui.
Em 1947, participou de Fogo na canjica, filme de Luís de Barros, diretor com quem trabalharia em 1949 no filme Eu quero é movimento. Em 1954 voltou a fazer dupla com Bentinho, com quem gravaria mais alguns discos.
Em 1954, passaram a se apresentar no programa do Capitão Furtado, na Rádio Piratininga em São Paulo. Durante esse período a dupla apresentou-se em diversas cidades brasileiras. Com o término da parceria, Xerém apresentou em diversas emissoras de rádio o programa "Na palhoça do Xerém". Atuou no episódio "Tesouro perdido", da série de televisão Vigilante Rodoviário.
Em 1978, gravou um LP em que se destacaram as músicas Na palhoça do Xerém, dele e Reinaldo Santos, Quatro namorados, de Xerém e Capitão Furtado, No Ceará tem, parceria com Claudir Durante e Trem de Jequiá, parceria com Luciano Garcia.
Em 2009, foi homenageado pela neta Cris Aflalo, que interpretou, no programa "Viola minha viola", na TV Cultura de São Paulo, acompanhada pelo sanfonero Oswaldinho do Acordeom, seu baião Alegria comigo mora, parceria com Mané Baião.
Fontes: Wikipédia; Dicionário Cravo Albin da MPB; Revista semanal Carioca, de 6/2/1937 (foto).
A partir de 1926 apresentou-se em circos e teatros pelo Brasil, integrando a "Trupe de Crianças Pequenas Edson", formada por seu pai. Em 1937 veio para o Rio de Janeiro com a irmã Nadir, com quem formava a dupla Xerém e Tapuia. Apresentaram-se inicialmente na Rádio Tupi e posteriormente foram efetivados no programa "Festa na roça", apresentado pelo Capitão Furtado.
Em 1937 gravaram o primeiro disco, cantando Quadria no arraiá, de Xerém e Pequeno Edson, e o choro Forró na roça, de Xerém e Manoel Queiroz.
A partir de 1939 passou a formar dupla com Bentinho, que cantara durante algum tempo com Alvarenga. No mesmo ano, a dupla gravou o primeiro disco cantando a moda de viola Chapéu das moças, de Xerém e Bentinho, e a rancheira Mariquita de Pequeno Edson. A dupla apresentou-se no programa de César Ladeira, na Rádio Mayrink Veiga, onde lançou várias músicas.
Em 1941, a cantora Araci de Almeida gravou Mamãe baiana, parceria de Xerém e Joraci Camargo.
A dupla Xerém e Bentinho lançou diversos discos, principalmente pela RCA Victor, como o calango Avoa jacutinga, de José Alves Torres, e a moda de viola Moda do casamento, de Xerém e Bentinho.
Em 1943, Xerém passou a fazer dupla com De Moraes, com quem gravou, em junho de 1944, a marcha Lá vai balão, de Xerém e Pequeno Edson, e a valsa Saudades de Marianinha, de De Moraes. No mesmo ano, Xerém participou do filme Abacaxi azul de J. Rui.
Em 1947, participou de Fogo na canjica, filme de Luís de Barros, diretor com quem trabalharia em 1949 no filme Eu quero é movimento. Em 1954 voltou a fazer dupla com Bentinho, com quem gravaria mais alguns discos.
Em 1954, passaram a se apresentar no programa do Capitão Furtado, na Rádio Piratininga em São Paulo. Durante esse período a dupla apresentou-se em diversas cidades brasileiras. Com o término da parceria, Xerém apresentou em diversas emissoras de rádio o programa "Na palhoça do Xerém". Atuou no episódio "Tesouro perdido", da série de televisão Vigilante Rodoviário.
Em 1978, gravou um LP em que se destacaram as músicas Na palhoça do Xerém, dele e Reinaldo Santos, Quatro namorados, de Xerém e Capitão Furtado, No Ceará tem, parceria com Claudir Durante e Trem de Jequiá, parceria com Luciano Garcia.
Em 2009, foi homenageado pela neta Cris Aflalo, que interpretou, no programa "Viola minha viola", na TV Cultura de São Paulo, acompanhada pelo sanfonero Oswaldinho do Acordeom, seu baião Alegria comigo mora, parceria com Mané Baião.
Fontes: Wikipédia; Dicionário Cravo Albin da MPB; Revista semanal Carioca, de 6/2/1937 (foto).
A primeira companhia teatral infantil
"Dois nomes que encabeçaram a primeira companhia teatral infantil fundada no Brasil, Xerém e Tapuia, estão, atualmente, na PRE-8 (Rádio Nacional).
Há 14 anos passados, em Fortaleza, lá no Norte, começou a correr a fama de uma certa família cujos membros, na sua maioria ainda infantis, demonstravam admiráveis qualidades artísticas desenvolvidas nos serões tão comuns dos lares nortistas.
O chefe da família tocava violino, acompanhando com seu instrumento a prole vastamente cearense. A mãe da gurizada era poetisa e escrevia pequenas peças teatrais que, sempre em família, eram interpretadas pelos pequenos. Xerém e Tapuia, nossos entrevistados de hoje, participavam da família em questão. Ele já tocava os seus solos numa gaitinha e ela cantava tangos e canções. Dentre os irmãos, que eram muitos, avultava a figura do Edison, verdadeiro menino-prodígio que o Brasil ainda consagraria, como consagrou.
Dos serões familiares passaram a exibir-se em festinhas particulares, depois em teatros locais. E porque o sucesso fosse crescente, resolveram excursionar pelo interior do Ceará, onde lograram marcado êxito. Então a família de artistas já havia organizado uma companhia da qual participavam mais três elementos femininos estranhos, igualmente infantis. A "Troupe do Pequeno Edison" executava comédias, bailados, variedades. Percorrendo o sertão cearense tiveram oportunidade de visitar o padre Cícero, que pasmou diante do talento da criançada.
Finda a "tournée" pelo interior, planejaram uma excursão pelo Brasil. Saindo de Fortaleza, em 1926, desceram com destino ao Rio, parando em todos os portos de escala. Edison, que por essa época tinha seis anos, era a alma do conjunto. Ganhava prêmios em todas as cidades onde se exibia. Os principais teatros das várias caoitais visitadas inauguravam placas comemorativas da sua passagem. Chegando ao Rio a "troupe" deu seu primeiro espetáculo no Teatro Fênix. Imediatamente depois foi contratado pelo empresário Serrador para trabalhar no Odeon, onde realizaram uma longa temporada durante a qual Edison ganhou várias medalhas.
Por esse tempo começava a febre do "charleston" e o grupo soube aproveitar a oportunidade ensaiando e executando com grande sucesso os passos audaciosos da nova dança. Tiveram propostas de empresários paulistas para trabalharem na capital bandeirante. Foram e repetiram os sucessos. Mas o tempo passava e o pessoalzinho miúdo crescia sem atentar na conveniência de permanecer pequeno ...
A troupe foi dissolvida depois de percorrer todo o Brasil. Era mister, segundo a opinião razoável do chefe da família, que a gurizada entrasse para um colégio. E a família fixou residência em Juiz de Fora, a fim de promover a educação sistemática das crianças, deixando por completo da vida teatral.
Xerém, uma das figuras centrais da trupe, não desprezou a gaitinha. Fez serenatas, continuou cantando em saraus familiares a atuou na Rádio Sociedade de Juiz de Fora. Fez tanto sucesso que resolveu aventurar algo no Rio. Aqui chegando ingressou na Rádio Philips, no "Programa Casé"; depois na Educadora e na Guanabara, sempre interpretando o folclore nortista.
Logo que terminaram seus estudos secundários, os ex-componentes da trupe infantil se transferiram para o Rio.
Atualmente Xerém e Tapuia, os dois irmãos, constituem uma dupla apreciadíssima que atua aos nossos microfones e continua frequentando palcos.
Estiveram em nossa redação. Cresceram apenas na idade, conservando a estatura infantil, o que os faz ainda mais simpáticos.
Disse-nos Tapuia:
— Parece que a minha infância se prolonga porque eu continuo adorando a gentinha miúda, para a qual leciono num colégio de Ipanema. Aproveitando a ideia de Xerém, resolvi fazer uma dupla com ele, que parece ter agradado. Já cantamos na Guanabara, na Educadora e na Nacional, onde estamos, atualmente, bem como na Tupy.
— Já estivemos também na Mayrink — disse-nos Xerém — e fomos contratados pela Victor para gravarmos algumas músicas que, esperamos, conseguirão a atenção dos foliões cariocas."
Fonte: Revista semanal "Carioca", de 1/1/1938 (foto e texto atualizado).
Há 14 anos passados, em Fortaleza, lá no Norte, começou a correr a fama de uma certa família cujos membros, na sua maioria ainda infantis, demonstravam admiráveis qualidades artísticas desenvolvidas nos serões tão comuns dos lares nortistas.
O chefe da família tocava violino, acompanhando com seu instrumento a prole vastamente cearense. A mãe da gurizada era poetisa e escrevia pequenas peças teatrais que, sempre em família, eram interpretadas pelos pequenos. Xerém e Tapuia, nossos entrevistados de hoje, participavam da família em questão. Ele já tocava os seus solos numa gaitinha e ela cantava tangos e canções. Dentre os irmãos, que eram muitos, avultava a figura do Edison, verdadeiro menino-prodígio que o Brasil ainda consagraria, como consagrou.
Dos serões familiares passaram a exibir-se em festinhas particulares, depois em teatros locais. E porque o sucesso fosse crescente, resolveram excursionar pelo interior do Ceará, onde lograram marcado êxito. Então a família de artistas já havia organizado uma companhia da qual participavam mais três elementos femininos estranhos, igualmente infantis. A "Troupe do Pequeno Edison" executava comédias, bailados, variedades. Percorrendo o sertão cearense tiveram oportunidade de visitar o padre Cícero, que pasmou diante do talento da criançada.
Finda a "tournée" pelo interior, planejaram uma excursão pelo Brasil. Saindo de Fortaleza, em 1926, desceram com destino ao Rio, parando em todos os portos de escala. Edison, que por essa época tinha seis anos, era a alma do conjunto. Ganhava prêmios em todas as cidades onde se exibia. Os principais teatros das várias caoitais visitadas inauguravam placas comemorativas da sua passagem. Chegando ao Rio a "troupe" deu seu primeiro espetáculo no Teatro Fênix. Imediatamente depois foi contratado pelo empresário Serrador para trabalhar no Odeon, onde realizaram uma longa temporada durante a qual Edison ganhou várias medalhas.
Por esse tempo começava a febre do "charleston" e o grupo soube aproveitar a oportunidade ensaiando e executando com grande sucesso os passos audaciosos da nova dança. Tiveram propostas de empresários paulistas para trabalharem na capital bandeirante. Foram e repetiram os sucessos. Mas o tempo passava e o pessoalzinho miúdo crescia sem atentar na conveniência de permanecer pequeno ...
A troupe foi dissolvida depois de percorrer todo o Brasil. Era mister, segundo a opinião razoável do chefe da família, que a gurizada entrasse para um colégio. E a família fixou residência em Juiz de Fora, a fim de promover a educação sistemática das crianças, deixando por completo da vida teatral.
Xerém, uma das figuras centrais da trupe, não desprezou a gaitinha. Fez serenatas, continuou cantando em saraus familiares a atuou na Rádio Sociedade de Juiz de Fora. Fez tanto sucesso que resolveu aventurar algo no Rio. Aqui chegando ingressou na Rádio Philips, no "Programa Casé"; depois na Educadora e na Guanabara, sempre interpretando o folclore nortista.
Logo que terminaram seus estudos secundários, os ex-componentes da trupe infantil se transferiram para o Rio.
Atualmente Xerém e Tapuia, os dois irmãos, constituem uma dupla apreciadíssima que atua aos nossos microfones e continua frequentando palcos.
Estiveram em nossa redação. Cresceram apenas na idade, conservando a estatura infantil, o que os faz ainda mais simpáticos.
Disse-nos Tapuia:
— Parece que a minha infância se prolonga porque eu continuo adorando a gentinha miúda, para a qual leciono num colégio de Ipanema. Aproveitando a ideia de Xerém, resolvi fazer uma dupla com ele, que parece ter agradado. Já cantamos na Guanabara, na Educadora e na Nacional, onde estamos, atualmente, bem como na Tupy.
— Já estivemos também na Mayrink — disse-nos Xerém — e fomos contratados pela Victor para gravarmos algumas músicas que, esperamos, conseguirão a atenção dos foliões cariocas."
Fonte: Revista semanal "Carioca", de 1/1/1938 (foto e texto atualizado).
quarta-feira, maio 07, 2014
Pinheirinho, o humorista de cinco instrumentos
Pinheirinho conseguiu dar uma feição diferente a cada instrumento que lhe cai às mãos: ensaia com violão acordes boêmios, ensina ao cavaquinho novas modalidades de som, faz o banjo ficar muito alegre, empresta ao violão-tenor uma outra voz e consegue com o "tryolin" ressonâncias básicas. Ele é o esplêndido estilizador de melodias simples, gostando de criá-las a seu modo. Por isso mesmo, nunca se atrapalha com todos os instrumentos que acompanham a sua vida de artista vitorioso.
Pinheirinho é um dos antigos elementos do "broadcasting" brasileiro, tendo atuado ao microfone pela primeira vez em 1926, ainda na antiga Rádio Record, então sob a direção de Álvaro Liberato de Macedo. Sempre às voltas com seus instrumentos prediletos, Pinheirinho integrou durante algum tempo o "Quarteto dos Kalungas", um programa do qual faziam parte mais três artistas da força de Pinheirinho: Barreto, Lázaro e Machado.
Sua carreira artística tem sido das mais felizes percorrendo estações de rádio se contratou durante longo tempo na Record, obtendo o primeiro prêmio, medalha de ouro, em concurso de músicas brasileiras. Depois, atuando no palco, obteve de Procópio Ferreira o título de "humorista do cavaquinho", um de seus instrumentos prediletos.
Deixando a vida teatral regressou ao microfone, que o recebeu festivamente. Agora contrato pela Rádio Nacional, depois de ter percorrido sempre com êxito diversas outras emissoras do Rio e de São Paulo, ele se declara perfeitamente satisfeito.
Falando à CARIOCA, fez questão de se confessar encantando com a gentileza dos ouvintes, os quais chegam a lhe escrever cartas em português, francês, etc ...
O seu nome verdadeiro é Adail Pinheiro Machado, natural de São Paulo.
Na PRE-8 ele atua sempre com grande sucesso, tocando os seus cinco instrumentos, um de cada vez, cada qual com seu estilo próprio.
Pinheirinho já tem viajado muito pelo interior do Brasil e pretende continuar viajando. Além de artista ele é também ativo funcionário do Ministério da Agricultura.
Fonte: Artigo da revista semanal "Carioca" de janeiro de 1937, atualizado para a nossa ortografia atual, com foto e propaganda daquela época.
Pinheirinho é um dos antigos elementos do "broadcasting" brasileiro, tendo atuado ao microfone pela primeira vez em 1926, ainda na antiga Rádio Record, então sob a direção de Álvaro Liberato de Macedo. Sempre às voltas com seus instrumentos prediletos, Pinheirinho integrou durante algum tempo o "Quarteto dos Kalungas", um programa do qual faziam parte mais três artistas da força de Pinheirinho: Barreto, Lázaro e Machado.
Sua carreira artística tem sido das mais felizes percorrendo estações de rádio se contratou durante longo tempo na Record, obtendo o primeiro prêmio, medalha de ouro, em concurso de músicas brasileiras. Depois, atuando no palco, obteve de Procópio Ferreira o título de "humorista do cavaquinho", um de seus instrumentos prediletos.
Deixando a vida teatral regressou ao microfone, que o recebeu festivamente. Agora contrato pela Rádio Nacional, depois de ter percorrido sempre com êxito diversas outras emissoras do Rio e de São Paulo, ele se declara perfeitamente satisfeito.
Falando à CARIOCA, fez questão de se confessar encantando com a gentileza dos ouvintes, os quais chegam a lhe escrever cartas em português, francês, etc ...
O seu nome verdadeiro é Adail Pinheiro Machado, natural de São Paulo.
Na PRE-8 ele atua sempre com grande sucesso, tocando os seus cinco instrumentos, um de cada vez, cada qual com seu estilo próprio.
Pinheirinho já tem viajado muito pelo interior do Brasil e pretende continuar viajando. Além de artista ele é também ativo funcionário do Ministério da Agricultura.
Fonte: Artigo da revista semanal "Carioca" de janeiro de 1937, atualizado para a nossa ortografia atual, com foto e propaganda daquela época.