quarta-feira, janeiro 29, 2014

A inauguração da Rádio Nacional

Em 1936, durante a ditadura Vargas, nasce a Rádio Nacional, no Rio de Janeiro. Durante a repressão, torna-se a voz do governo, que deve muito de seu sucesso ao trabalho de massa desenvolvido pela rádio. Em 8/3/1940, ao adquirir o veículo, Getúlio tornou-a a rádio oficial do Brasil. A Rádio Nacional recebia uma verba do governo para manter o melhor elenco da época, dentre eles músicos, cantores e radio atores (Canal da Imprensa).

Abaixo transcrevo a reportagem da revista CARIOCA de 12/9/1936, data da inauguração da Nacional do Rio de Janeiro, em texto atualizado:

"Um grande acontecimento na radiofonia brasileira. Inaugura-se hoje a PRE-8, Rádio Nacional, a mais forte estação do país. O cast notável da nova emissora".

"A data de hoje se destina a marcar uma etapa nova da evolução da radiofonia no Brasil, com a inauguração da Rádio Nacional, a grande e potente emissora que o Brasil inteiro esperava. Os radiouvintes estão, hoje, de parabéns, por esse festivo acontecimento, pois a Rádio Nacional, com seus 22 quilowatts, será ouvida por todo o país, desde o Amazonas ao Rio Grande do Sul, abrangendo, num grande elo sonoro, numa cadeia de vibrações etéreas, todas as nossas fronteiras.

Aracy de Almeida - 1936
Mas esse regozijo não deve ser inspirado somente pela potencialidade da nova estação, como, também, pelas suas finalidades educativas e culturais, de vez que é a maior realização particular já tentada no país para fazer do "broadcasting" um instrumento poderosíssimo de difusão da arte musical, de informações e debates proveitosos.

A Rádio Nacional aparece ligada ao grande consórcio jornalístico integrado pela "A Noite", o mais lido e mais prestigioso vespertino brasileiro, e pelas revistas de maior tiragem do nosso país, "A Noite Ilustrada", CARIOCA e "Vamos Ler!", a última apenas com pouco mais de um mês de vida, mas já galhardamente vitoriosa. Não é a Rádio Nacional um órgão dependente de "A Noite", mas um elemento autônomo, perfeitamente sincronizado com aquele diário e suas revistas, nutrindo-se dos mesmos recursos de informação, das mesmas fontes que a todos garante a divulgação completa e palpitante dos fatos de maior repercussão nacionais ou estrangeiros.

Sylvinha Mello - 1936
A Rádio Nacional terá o maior e mais escolhido "cast" de artistas exclusivos, dele fazendo parte, entre outros, os seguintes elementos: Abigail Parecis, soprano lírico de mérito, que conquistou aplausos internacionais e realizou brilhante temporada em Nova York; Sônia de Carvalho, festejada intérprete de música brasileira, que em São Paulo conquistou justo prestígio; Aracy de Almeida, a nova e mais perfeita intérprete do samba; Dolly Enol, intérprete de canções; Marília Batista, a menina que estilizou e deu ao samba uma expressão nova; Elisa Coelho, cantora de estilo próprio, que os fãs muito admiram; Silvinha Mello, a voz jovem do folclore brasileiro; Amália Diaz, o tango em pessoa; Bob Lazy, intérprete de fox; Ben Wright, intérprete de fox-blue; Mauro de Oliveira, intérprete de canções internacionais; Nuno Roland, intérprete de canções; Joaquim Pimentel, intérprete de canções portuguesas; e Pasquale e Gambardella, cantor lírico.

Terá a Rádio Nacional três "speakers": Ismênia dos Santos, Celso Guimarães e Oduvaldo Cozzi, e três diretores de orquestra: Romeu Ghipsman, Gaó e Radamés Gnatalli. As orquestras são nove: Orquestra Sinfônica, Orquestra Vienense, Orquestra Havaiana, Orquestra de Jazz, Orquestra Regional, Orquestra Típica Argentina, Orquestra Típica Portuguesa, Orquestra Serenata, Orquestra de Cordas. No grupo de instrumentistas, há nomes como Pereira Filho, o mágico do violão, e Luiz Americano, o homem que faz o saxofone falar. Genolino Amado, redator-chefe da "Hora do Brasil", é o cronista da Rádio Nacional, e Rosário Fusco o redator. O som é controlado pelo hábil e competente engenheiro L. R. Evans.

Nuno Roland - 1936
A PRE-8 também irradiará, matinalmente, aulas de ginástica do professor Oswaldo Diniz de Magalhães, com acompanhamentos de piano, para ritmar os exercícios, pelo pianista Jorge Paiva.

CARIOCA se congratula com os radiouvintes de todo o Brasil, — que tem tido nesta revista uma tribuna para a manifestação de seu pensamento, — pelo expressivo acontecimento de hoje, a inauguração da PRE-8, Rádio Nacional, a grande emissora, a mais nova e a maior estação do país."


Fontes: CARIOCA, de 12/9/1936; Canal da Imprensa.

Um craque do saxofone

Luiz Americano - CARIOCA 12/9/1936
Quando um homem nasce fadado a ser artista de valor, começa em pequenino a fabricar instrumentos dos galhos de mamoeiro, fazendo flautas, cometas, etc. Luiz Americano foi um caso assim.

Nascido em Sergipe, demonstrou desde garoto invulgar predileção pela música. Estudando saxofone, progrediu assombrosamente, em pouco tempo. Hoje, que além de saxofone Luiz Americano toca também eximiamente clarinete e bandoneon, já tem alcançado na vida êxitos capazes de consagrá-lo.

Exibindo-se em cassinos, dirigindo orquestras, no Brasil e na Argentina, além de atuar em várias estações de rádio, Luiz tornou-se em pouco tempo um nome admirado e conhecido.

Rádio Nacional contratou-o, recentemente.

Uma carreira feliz

— Divido a minha carreira em duas etapas — diz Luiz Americano. — Uma no Brasil, outra na Argentina. Tive em Buenos Aires uma vida artisticamente atribulada. Sucesso também dá trabalho. . . As emoções experimentadas aqui não foram renovadas lá. Simplesmente foram vividas de outra maneira. O povo argentino não é tão fácil ao aplauso como o brasileiro. Mas quase sempre é acolhedor para a música brasileira.

Na Argentina, Luiz Americano exibiu-se em muitos teatros, cassinos, estações de rádio, obtendo grande êxito.

— Também gravei vários discos. Composições minhas. Tenho, aliás, mais de trinta, todas elas felizmente bem sucedidas.

Entrando para o Rádio

— Se o cinema falado e sincronizado veio até certo ponto prejudicar a atuação de muitos artistas que viviam das orquestras dos cinemas, o rádio, progredindo, chegou para compensar esse fato. Observo que existem hoje, colocados nas orquestras dos estúdios muitos artistas que exploraram aquele outro ramo de vida.

Pela sua parte Luiz Americano, que sempre se exibiu em vários lugares ao mesmo tempo, também tocou durante longo tempo na orquestra de um dos nossos principais cinemas. Há quatro anos passados ingressou para o rádio, estreando-se num programa de Renato Murce e Gramury, na Rádio Sociedade.

Um fã dos outros artistas

No nosso “broadcasting” Luiz Americano já atuou em várias estações, sendo um admirador do progresso apresentado pelos programas.

Distingo entre os bons dirigentes Renato Murce. Capacidade e talento além de espírito batalhador. Na parte musical, devo declarar que observo muito apreciando os verdadeiros valores. Entre os intérpretes de saxofone, por exemplo, admiro Dedé e Sandoval, artistas de valor. Violinista, Pereira Filho, o mais movimentado, inspirado e admirável. Na flauta, reconheço um artista absoluto: Pixinguinha. Entre os cantores e cantoras, Sílvio Caldas, Francisco Alves, Carmen Miranda e Aracy de Almeida.

Música sinfônica

— Estou, no entanto, muito longe de apreciar unicamente o gênero popular. Prefiro mesmo a música sinfônica a qualquer outra, admirando Cesar Franco, Wagner, Beethoven e Rimisk Kovsakowisk — aliás um dos mais apreciáveis compositores da música árabe.

Luiz Americano gosta do ritmo árabe. Nas suas composições executa toda espécie de música. Atualmente tem composto muitas valsas e choros, sendo uma das suas últimas produções uma linda música intitulada “Yolanda Pereira”, que é aliás a sua predileta.

— Dedicada a Miss Universo 1930?

— Não ... — respondeu-nos Luiz Americano. — Dediquei-a à senhorita Yolanda Pereira, graciosa irmã de Pereira Filho.

Luiz Americano, que será um dos bons elementos da Rádio Nacional, dirige também um dos principais dancings do Rio e é um homem perfeitamente amável e simpático.

— Sinto-me perfeitamente bem no meio radiofônico, apreciando todos os colegas.

Ele referiu-se também entusiasticamente ao talento de Radamés Gnatalli, o surpreendente pianista da PRE-3.
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Fonte: CARIOCA, de 12/9/1936.