terça-feira, junho 10, 2014
Horacina Correia, a Patativa do Sul
"Estava pela metade o programa de Horacina Correia na Tupi. Ela acabou de cantar e veio respirar um pouco de ar livre. O repórter a cumprimentou. Horacina chegou de Porto Alegre no dia 2 de abril e estreou no dia 5. Agradou muito, pois canta sambas e marchas. Firmou-se no conceito do público ouvinte carioca.
Estava na Farroupilha, onde ainda deixou contrato. Nasceu lá mesmo, em Porto Alegre. Frequentou a Escola Paula Soares e depois a Escola Normal. Era sempre a primeira aluna da aula. Não saiu do Rio Grande do Sul. Aí viveu até ser convidada pela PRG-3 para vir atuar no Rio. É casada. Seu marido também é artista e veio com ela. Ambos na Tupi.
— Quantos anos de rádio?
— Um ano e meio. Estreei na Rádio Gaúcha, onde estive apenas dias. A seguir fui para a Difusora. Sai para descansar e parei alguns meses. Depois o pianista da Farroupilha, Paulo Coelho, procurou-me. Então, transportei-me para essa última estação. Todo mundo me conhece muito.
— Como se iniciou na interpretação de sambas?
— Eu comecei cantando desde pequenininha. Meu pai era cantor e acompanhava meus balbucios artísticos ao violão. Mas sempre em casa ... Tomei parte em diversas festas sociais de Porto Alegre. Em teatros. Em outros festivais. Fiz parte do cordão carnavalesco "Os turunas". Isso foi antes do rádio me tentar.
— Quais as músicas que mais aprecia?
— Em primeiro lugar samba e marcha. Depois uma valsa bem lânguida. Um foxtrot bem dinâmico. Um tango ...
— Sentir-se-ia capacitada para interpretar qualquer outro gênero?
— Além de sambas e marchas? Sim. Canto valsas. Canções. Foxes. Tangos ... Antes de entrar para a Gaúcha eu cantava essas melodias todas. Mas agora parei com elas. Você compreende? O samba é brasileiro ...
— Que acha do rádio?
— É a oitava maravilha do mundo ... O cinema, o avião, a lancha motor, todos esses marcos do progresso podem ser considerados maravilhas, porém, no meu ponto de vista, o rádio é a maravilha das maravilhas ...
— Está satisfeita nesse setor de atividade artística?
— Muito. Muitíssimo. Gosto de cantar. Creio que assim, cantando pelo amor à arte, poderei auxiliar a difusão da música popular brasileira no estrangeiro ...
— Qual é a artista do microfone que mais aprecia?
— Gosto de todas. Mas tenho uma predileção acentuada por Carmen Miranda. No naipe masculino destaco Carlos Galhardo. E penso que esse trunfo vence qualquer parada ...
— O que faz fora do microfone?
— Estudo piano. Leio muito. Adoro os romances policiais ... Há tempos estudava canto. Mas deixei. Creia que não é por me julgar grande coisa ... Uma artista que preza a sua arte jamais se julga suficientemente instruída ... Minhas distrações são quase resumidas numa só: cinema.
— E que artista de Hollywood aprecia mais?
— Katharine Hepburn. Antigamente eu era fã inveterada de Lon Chaney. Ele morreu. Ficou Boris Karloff. Agora sou fã de Karloff ...
— Gostaria de entrar para o cinema?
— Só se fosse para fazer papel de selvagem. De indígena brasileira. Creio que não dava para mais nada. Poderia cantar sambas e marchas ... Não tenho jeito para cinema. Isto se vê logo ...
— O que desejaria mais na vida?
— Vida artística, melhor dizendo ... Meus ideais são quatro que formam uma grande aspiração. Gravar muito. Agradar sempre o público. Ter nome feito no "broadcasting". Difundir cada vez mais a música brasileira ...
— Fez alguma grande viagem?
— Esta de vir à Capital Federal foi a minha maior viagem. No Rio Grande andei correndo aquilo tudo. Estive numa turnê artística pelo interior, chegando até ao Uruguai. O Uruguai para nós, rio-grandenses, é o mesmo que Cascadura para vocês, citadinos cariocas ...
— Espera algumas novidades para breve?
— Espero. Sempre esperei. Estou gravando dois sambas de Benedito Lacerda na Victor. Tive propostas para Buenos Aires e para São Paulo. É muito tentador. Mas você compreende? Ainda tenho o contrato na Rádio Farroupilha de Porto Alegre ...
— Que opinião tem dos ouvintes?
— Prefiro não meter a colher nesse assunto — terminou Horacina Correia sorrindo. — A comidinha tão agradável pode mudar de paladar ..."
Fonte: "CARIOCA" - Edição 83, de 22/5/1937 (artigo atualizado para o nosso português contemporâneo).