"Dois apitos" era a expressão, nos anos de 1930, de quem tinha duas profissões paralelas. Benedicto Lacerda, desculpem, Benedito Lacerda, instrumentista (exímio flautista), compositor e regente, nascido em Macaé, Rio de Janeiro, em 14/3/1903, foi um dos "monstros sagrados", ao lado do incrível Pixinguinha, da nossa Música Popular. Aqui uma reportagem da revista CARIOCA, de novembro de 1935, sobre o nosso artista:
"Não houve, no último carnaval, e mesmo depois dele, quem no Brasil inteiro não cantasse:
Eva, querida,
Quero ser o teu Adão,
Dar-te-ei o meu amor, a minha vida,
Em troca de teu coração.
O autor desta marchinha, como de muitas outras músicas populares, foi Benedito Lacerda, que agora atua no “broadcasting” como flautista e diretor de um conjunto regional. Benedito Lacerda, que acaba de ser contratado pela Rádio Belgrano, de Buenos Aires, para propagar na metrópole argentina a nossa música carnavalesca, foi, em garoto, jornaleiro, dedicando-se a venda dos jornais vespertinos. Depois, rapazinho, foi caixeiro de armarinho.
E exerceu até bem pouco tempo essa profissão, conservando ainda o calo do metro. Começou a tocar, de ouvido, numa flauta de bambu. Aprendeu mais tarde musica por escala, dedicando-se também ao saxofone. Inimigo das oito horas de trabalho, Benedito Lacerda despediu-se do estabelecimento em que trabalhava, logo que as suas músicas começaram a interessar ao público.
“Criança, toma juízo...”, samba, “Ciganinha”, marcha, “Querido Adão”, música carnavalesca, são algumas de suas produções de êxito. “Eva, querida” é agora verdadeira coqueluche em Buenos Aires.
— Prefiro viver como vivo agora, — diz Benedito Lacerda, — sem preocupações de horários e ralhos de patrões. Um dia, toco. No outro, canto. Irradio, gravo discos e vou ganhando a “nota”. Depois do Carnaval, irei ver como param as coisas no Prata...
Benedito Lacerda fez questão de mostrar a CARIOCA que ainda entende de seu antigo mister de caixeiro de armarinho. Meteu-se atrás de um balcão e em poucos minutos vendeu um “stock” de roupas feitas, por preços verdadeiramente escandalosos, mas com a vantagem de as vender fiado, sem sequer perguntar os nomes dos fregueses."
Fonte: CARIOCA, de 30/11/1935.
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