sexta-feira, dezembro 27, 2013

Lalá, Lelé, Lili...

Lili (Lycia Carvalho Costa Reis), cantora, nasceu em Niterói, RJ, mas ainda recém-nascida, seus pais se mudaram para São Paulo, Capital. Desde cedo, muito jovem ainda, ouvia rádio, cantava e tocava piano e violão.

O cantor Paraguaçu a levou ao maestro Gaó, que atuava na rádio Cruzeiro do Sul, que também irradiava para o Rio de Janeiro. Especializou-se em interpretar canções folclóricas brasileiras.

Para saber mais detalhes sobre a vida dessa artista, tão esquecida pelos "dicionários da MPB", acessem o site Museu da Pessoa, quando foi entrevistada recentemente, em 03/12/2013. À seguir uma reportagem da CARIOCA, de dezembro de 1935:

“Lili... —— Duas sílabas, idênticas e pequeninas, que evocam um mundo imenso de coisas e fantasias. Lili, lembra Carnaval. Sugere logo um “cordão” na Avenida, dançando e cantando:

“Lili, Ó meu bem
Teu amor eu tenho...”

Lili sempre foi motivo de inspiração para os sambistas cariocas, que infelizmente não conhecem a Lili paulista, cantora destacada e de mais futuro da Rádio Cosmos. Lili não tem sobrenome. Quer ser simplesmente Lili. É assim que o “speaker” a anuncia e foi assim que a chamamos para conversar um pouco conosco.

—— Tenho quase um ano de rádio, ora na Cosmos, ora na Cruzeiro, começou ela.

—— Como resolveu e conseguiu entrar para o rádio?

—— Todas as moças que gostam de rádio, tem no íntimo, pode estar certo, um grande desejo de cantar para o microfone para ouvir... Eu como as outras também tinha este desejo. Vontade não me faltava e vivia, assistindo nos estúdios, as transmissões. Uma criatura havia, que me despertava grande entusiasmo e a quem eu considerava um semideus — Gaó. Creio que o dia em que conseguisse falar com ele, seria o maior de minha vida. A oportunidade chegou: um dia ele estava no estúdio e eu gaguejando perguntei-lhe se era difícil cantar no rádio. Respondeu-me que dependia da voz. Fiz a experiência e dias depois, cantava num programa, quatro músicas: uma valsa, um samba, um fox e uma canção. Agradei...

—— Qual destes gêneros prefere?

—— A canção regional. Acho-a encantadora. Tem para mim encantos que dificilmente se podem exprimir. Mais do que qualquer outra música, pode a canção provocar a nostalgia numa criatura. Tem a canção toda a beleza e a grandiosidade do nosso país.

—— Qual, dentre as canções, é a sua predileta?

—— Das compostas exclusivamente para mim, “Pipoca, amendoim torrado”, de Príncipe Bugre. Tem dentro de sua melodia, toda a tristeza e a dolência de nossa alma. A minha predileta é, porém, “Leilão”, de Heckel Tavares, que às vezes chega a me provocar lágrimas...

—— Qual o compositor predileto?

—— Gosto de vários: Heckel, Joubert, Waldemar Henrique, Tupinambá. Creio porém que o primeiro ainda é o predileto, pois conheço e interpreto todas as suas composições.

—— Que pensa do fox americano?

—— Gosto. Acho-o lindo. Parece-me, porém, que não é muito de acordo com o nosso temperamento.

—— E por que não canta foxes?

—— Ao público parece sempre ridículo que uma brasileira cante, em inglês, coisas inglesas. Acham que devemos cantar sempre em português.

—— É então, muito exigente, o público paulista? ...

—— Terrível! Mais que o carioca. No Rio vê-se cantoras, meses e meses, com o mesmo repertório. Em São Paulo, se cantamos a mesma música três dias seguidos, começam logo os telefonemas de protesto.

—— Não tinha desejo de ir para o Rio?

—— Gostaria. O ideal, seria passar seis meses no Rio e seis aqui. Infelizmente, porém, é quase impossível realizá-lo, pois não tenho nenhuma proposta...

Ary Barroso apareceu. Vinha buscar Lili para dar começo à "Hora H", onde ela é figura de relevo e, dentro em pouco, víamos, através dos vidros da PRE-7, Lili tomando parte de um "sketch", e apresentando, assim, mais uma modalidade de sua arte, ainda nova para nós."

Jorge Maia, enviado especial de CARIOCA


Fontes: CARIOCA, de 28/12/1935; Museu da Pessoa, de 03/12/2013.