— Aquela é a Dilu — me disseram.
— Aquela? — perguntei espantado.
Achei a cantora do folclore minúscula demais. Tão minúscula quanto os olhos microscópicos de Sylvinha Mello. Pela vidraça eu a via cantar mas não ouvia coisa alguma. Dilu lá dentro parecia um peixinho num aquário abrindo e fechando a boca. Sylvinha, por exemplo, era um peixinho maior. O piano parecia uma espécie de baleia e o pianista o domador da baleia.
Daí a pouco a folclorista saiu e passou por junto a mim meio apressada. Em cima do seu chapéu preto havia uma peninha para atrapalhar. Saiu miudinha, ligeirinha, nervosinha e lá se foi pelo meio do povo. A peninha qual um periscópio, localizava-a onde estivesse.
Quis me aproximar dela, conversar um pouco, lhe perguntar a idade, o lugar de nascimento, as mais recentes composições de sua lavra, a distância que vai entre os dois vizinhos que são o cimo de sua cabeça e o solado dos seus pés, tive vontade de lhe perguntar uma porção de coisas para poder traçar, nestas mal traçadas linhas, modéstia à parte, sua caricatura.
Dilu nasceu em Viana/MA, em 25/9/1913 |
— Mas você tenha paciência, Dilu. Eu não posso lhe ouvir agora. Tenho que sair logo para um encontro marcado ...
E ela, procurando tranquilizar o ouvinte:
— Espere um pouco. Escute somente essas dezoito canções que eu fiz ontem de um fôlego só ...
O meu informante acrescentou:
— Se você que falar com ela, fale logo hoje que é melhor.
— É melhor por que?
Explicou-me:
— Diariamente a Dilu compõe umas vinte a trinta músicas. E a pessoa com quem ela conversar terá de ouvir tudo quanto foi composto durante a semana. Hoje é terça-feira e ainda há pouca coisa preparada, sem falar na produção do mês anterior ... Melhor é lhe ser apresentado agora do que daqui a seis meses. Se você quer, podemos aproveitar. Aí vem a artista ...
Respondi:
— Não. Deixa ... Teria muito prazer em conhece-la porque afinal a pequena é inteligente, canta com agrado e escreve umas composições deliciosas. Mas acontece que eu agora tenho um encontro marcado e não posso ..."
Fonte: "Carioca" — Edição 90, de 10/7/1937 — Caricaturas: Escrita por Theofilo de Barros e desenhada por Augusto Rodrigues